Como vimos, a falsificação ingênua não permite que os cientistas, que dependem de critérios objetivos, apresentem uma falsificação definitiva das declarações universais (teorias).
Havia um número indeterminado de possíveis explicações para esse desvio, tais como
Bouvard aventou a explicação de que um planeta desconhecido estaria afetando a trajetória de Urano e que a hipótese de que há sete planetas do nosso sistema solar é que era falsa.
No entanto, essa explicação pareceu ousada demais para os astrônomos da época, os quais ou a rejeitaram ou deram menor importância, não se empenhando em procurar o suposto oitavo planeta.
Em 1846, o planeta interferente, o qual hoje conhecemos como planeta Netuno, foi encontrado por Galle e d'Arrest, a apenas 1° de distância da posição prevista pelos cálculos de Le Verrier.
Neste caso, foi confirmada a hipótese ad-hoc 'existe um oitavo planeta no sistema solar que causa as irregularidades na órbita de Urano' e, com isso, não apenas 'salvou' como deu mais força à Teoria da Gravitação Universal de Newton.
No entanto, Lakatos (vide abaixo)
propos um interessante exemplo
de excesso de hipóteses ad-hoc
exatamente a partir de uma situação semelhante
à do desvio da órbita de Urano:
"A história é sobre um caso imaginário de mau comportamento planetário.
Um físico da era pré-einsteiniana utiliza a mecânica de Newton e a sua lei da gravitação, N, as condições iniciais aceites, I, e calcula, com a sua ajuda, a trajetória de um pequeno planeta recém descoberto p. Mas o planeta desvia-se da trajetória calculada. Será que o nosso físico newtoniano considera que o desvio era proibido pela teoria de Newton e, portanto, uma vez determinado, ele refuta a teoria N?
Não. Ele sugere que deve existir um planeta até então desconhecido, p', que perturba a trajetória de p. Calcula a massa, a órbita, etc., deste planeta hipotético e depois pede a um astrônomo experimental que teste a sua hipótese. O planeta p' é tão pequeno que nem mesmo o melhor telescópio existente tem possibilidade de o observar. O astrônomo experimental requer uma verba de pesquisa para construir um maior ainda . Três anos depois, o novo telescópio fica pronto. Se o planeta desconhecido p' fosse descoberto, seria aclamado como uma nova vitória da ciência newtoniana. Mas o planeta p' não é descoberto. Será que o nosso cientista abandona a teoria de Newton e a sua hipótese de um planeta perturbador p'?
Não. Desta vez, ele sugere que uma nuvem de poeira cósmica, n, nos oculta o planeta. Calcula a localização e as propriedades desta nuvem e requer um subsídio de investigação para enviar um satélite a testar os seus cálculos. Se os instrumentos do satélite, possivelmente novos, baseados numa teoria pouco testada, registrassem a existência da nuvem conjectural n, o resultado seria aclamado como uma vitória notável para a ciência newtoniana. Mas a nuvem n não é encontrada. Será que o nosso cientista abandona a teoria de Newton, juntamente com a ideia do planeta perturbador p' e da nuvem n que o oculta?
Não. Sugere que há um campo magnético qualquer c nessa zona do universo que perturbou os instrumentos do satélite. Se o campo magnético c fosse encontrado, os newtonianos celebrariam uma vitória sensacional. Mas não é encontado. Será isto considerado como uma refutação da ciência newtoniana?
Não. Ou se propõe ainda outra hipóteses auxiliar engenhosa ou... toda a história é enterrada nos volumes poeirentos dos periódicos e nunca mais é mencionada." (CHALMERS, 1993, p. 96-97)
Note-se, porém, que, no caso do planeta Mercúrio, cujo periélio precessiona 43 segundos de arco por século, também foram propostas diversas hipóteses ad-hoc para salvar a Teoria Newtoniana:
No caso de Mercúrio, porém, nenhuma hipótese ad-hoc foi confirmada e somente a Teoria da Relatividade Geral de Einstein conseguiu explicar esse fenômeno em 1915. Desta forma, juntamente com mais um grande número de outras evidências, a Teoria Newtoniana foi considerada refutada.
"Se em tudo o mais forem idênticas as várias explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor."
Ou seja, prefere-se a teoria que necessite de menos hipóteses ad-hoc.
Uma teoria ser indutiva ou especulativa não é um bom critério de demarcação, pois
Popper propos, como 'critério de demarcação', que Ciência é refutável e pseudociência, não.
No entanto, como veremos adiante, Bunge desenvolveu essa distinção, introduzindo outras categorias, além de ciência e pseudociência.
Exemplos de pseudociências, segundo Popper:
Ficou famoso pelos conceitos de 'Revoluções Científicas' e 'paradigmas'.
Após doutorar-se em Física, por Harvard, Kuhn teve que preparar um curso de ciências para não cientistas e decidiu ilustrar o curso com exemplos históricos de progressos científicos.
Até então, tinha tido pouco contato com a Filosofia e a História, mas vislumbrou uma construção não-linear do conhecimento, com saltos, rupturas e substituições de paradigmas vigentes.
Constatou que, numa perspectiva histórica, a Ciência é muito diferente da visão linear dos textos de física.
Para Kuhn, as ‘Revoluções Científicas’ acontecem em três fases:
Para Kunh,
"Um paradigma é o que os membros de uma comunidade científica compartilham. Reciprocamente, uma comunidade científica consiste de homens que compartilham um mesmo paradigma." (KUHN, 1970)
Isto sugere que científico não é uma questão de 'certo' ou 'errado', mas é aquilo que está de acordo com o paradigma vigente, isto é, científico é aquilo que a comunidade dos cientistas diz que é científico.
Um paradigma é uma matriz disciplinar, um conjunto de leis, modelos, valores, aceites pela comunidade. Não é conhecimento rigoroso, é tácito, flexível e vai sendo melhor elaborado com o desenvolvimento da ciência que o reconhece.
Um paradigma inclui:
Isso quer dizer que o paradigma exclui os problemas para o qual não se adapta!
Nesta fase, se algo não funciona (uma anomalia), em princípio, a culpa é do pesquisador, não do quebra-cabeças. Isto é, deve ser um erro de aplicação do paradigma.
Quando as anomalias se multiplicam, está-se na fase das crises.
No entanto, para ocorrer uma crise, é preciso
É muito difícil que uma ciência abandone um paradigma sem já ter outro para substituí-lo.
Se um cientista decide, ainda que com boas razões, abandonar sua certeza sobre como é o mundo sem substituí-lo por nada, ele deixa de ser cientista.
A Revolução científica acontece quando
Mais do que um período de mudança de paradigmas, uma Revolução científica é uma mudança na maneira de olhar o mundo!
Quando se vê duma maneira (paradigma), não se consegue ver da outra!
Não se consegue ver o coelho e o pato ao mesmo tempo.
Para Kuhn, os manuais
"Referem-se a um corpo já articulado de problemas, dados e teorias e […] ao conjunto de particular de paradigmas aceito pela comunidade científica na época em que […] foram escritos. […] não é necessário que proporcionem informações autênticas a respeito ao modo pelo qual essas bases foram inicialmente reconhecidas e posteriormente adotadas pela profissão." (KUHN, 1970)
Os manuais tem, assim, a função de 'evangelizar' seus leitores no paradigma vigente.
Pozo (1998) apresenta uma proposta de Ensino de Ciências que se assemelha à concepção de paradigmas e Revolução científica e consistiria em
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